Categoria: Internet "NY: em último desejo, idosa morre em hotel de luxo"





Marie-Dennet McDill amava o Hotel Carlyle. Ela se hospedava lá sempre que visitava Nova York, e adorava os cantores que costumam se apresentar no Café Carlyle, como Bobby Short e Eartha Kitt, bem como o pianista Loston Harris, no animado Bemelmans Bar.
Gostava dos ascensoristas e carregadores uniformizados e da equipe de funcionários veteranos que formava quase uma família. Adorava o fato de que o Central Park fica a apenas um quarteirão de distância.
Por isso, quando McDill, que cresceu na sociedade de Washington e mais tarde se dedicou à vida campestre em South Woodstock, Vermont, foi informada de que estava sofrendo de câncer terminal, alguns meses atrás, sua família imediatamente reservou uma suíte no oitavo andar para que ela se hospedasse no hotel por quanto tempo quisesse - infelizmente, não tanto tempo assim.
"A família me procurou e disse que queria uma suíte para ela até a morte", disse Alexandra Tscherne, diretora de residências do Carlyle. "Foi um pedido único, e eu nunca havia recebido solicitação semelhante. Queriam que ela estivesse em um de seus lugares mais queridos, porque não sabiam por quanto tempo sobreviveria".
A estadia durou 10 semanas, e McDill morreu durante o sono, no Carlyle, em 15 de outubro.
Aos 71 anos, ela parecia jovial e repleta de energia, e passava seus dias ao ar livre, cuidando do jardim e pintando, de modo que seus três filhos ficaram chocados ao descobrir no começo de agosto que ela estava sofrendo de um câncer que se espalhava rapidamente.
"Deixou de ser uma luta pela vida para ser uma questão de tempo", disse Thomas Gardner, filho de McDill.
A família contratou um serviço de enfermagem 24 horas, mas McDill, pelo menos até os últimos dias, estava em forma física e mental suficientes para desfrutar de sua estadia final no hotel. O Carlyle, na esquina da Avenida Madison com a rua 76, é um dos hotéis mais luxuosos da cidade, com longa lista de celebridades, presidentes e aristocratas que o escolheram para hospedagem e moradia.
Mesmo em seus últimos dias, McDill passeava de manhã pelo Central Park, e de noite sentava em um dos reservados nos fundos do Bemelmans, apreciando as divertidas ilustrações sobre a vida de Nova York que o artista Ludwig Bemelmans, mais conhecido pela série "Madeline" de livros infantis, pintou nas paredes, e apreciando o piano de Harris. Ela adorava Cole Porter, e fazia pedidos de canções transmitidos ao pianista pelo garçom.
A família contratou Harris para tocar as canções favoritas de McDill no serviço memorial, realizado sábado na igreja de São Bartolomeu, em Park Avenue. Foi uma ocasião pungente, sofisticada e descontraída, bem parecida com uma canção de Porter. Harris tocou "Just One of Those Things" e "I've Got You Under my Skin".
O aluguel mensal de uma suíte no Carlyle sai por US$ 27 mil na alta temporada e US$ 17 mil nos meses de verão.
"Não era uma busca por extravagância, mas uma busca por conforto. Não foi uma opção barata, mas era o maior conforto que podíamos custear, e por isso decidimos que o faríamos por ela", disse Gardner, vice-presidente de operações da Montley Fool, uma companhia de informações financeiras fundada por seu irmão David Gardner.
O pessoal do hotel ajudou McDill com algumas tarefas relacionadas à sua morte, diz Tscherne, que foi testemunha do testamento de McDill e até foi em pessoa buscar um notário, do outro lado da rua.
A família contratou duas enfermeiras do Brooklyn para cuidar de McDill - Rose Marie Moore e sua irmã Shirley Innis. Moore cantava spirituals para McDill, à noite.
"Ela recostava a cabeça e me pedia para cantar", conta Moore, que vinha de metrô do Brooklyn para tratar de McDill no Carlyle.
"Era sair da classe baixa e entrar na classe alta, ir até lá", ela conta. "Eu a chamava de minha rainha e de majestade, e ela me chamava de princesa - e me tratava como se eu fosse".
Moore cantou "Swing Low Sweet Chariot", o spiritual preferido de McDill, no serviço memorial, e os familiares trocavam lembranças sobre ela, descrevendo-a como menos uma mulher de sociedade e mais uma pessoa à maneira de Katherine Hepburn.
Depois de se formar na Escola Preparatória de Georgetown, em Washington, ela sonhava com uma carreira nas artes mas terminou se matriculando no Manhattanville College, no interior de Nova York, respeitando a vontade de seu pai, H. Gabriel Murphy, um dos donos da equipe de beisebol Washington Senators, mais tarde transferida para Minnesota com o nome Twins.
O primeiro marido de McDill foi o advogado Paul Gardner Jr.. Depois de um divórcio, ela se casou com Jonathan McDill, ex-diretor de catalogação das bibliotecas da Universidade Dartmouth, que morreu em 1998. Para seu trabalho de jardinagem, ela se inspirava nos jardins formais franceses e italianos e acrescentava toques pessoais.
McDill amava a pintura de Henri Matisse e a escrita de Mark Twain e Robert Frost. Ela vendeu alguns quadros, e deu muitos outros. Computadores e culinária pouco a interessavam.
"Ela sabia cozinhar, mas não gostava muito", disse David Gardner.
Depois do serviço memorial, alguns dos amigos de McDill disseram que estavam reconsiderando como desejariam se despedir do mundo.
"As pessoas me procuraram e disseram que nossa idéia as havia feito mudar de planos para seus funerais - elas queriam uma ocasião divertida", disse Thomas Gardner. "A única coisa triste é que minha mãe teria preferido continuar a viver".
Tradução de Paulo Migliacci
The New York Times